quarta-feira, 4 de agosto de 2010

Histórias de Vida


(por Américo Abalada)

1 - Memorizando
Aos cinco seis anos de idade fui, memorizando o que os meus pais me deviam ter contado muitas e muitas vezes coisas da nossa vida familiar. O meu pai foi preso  quando  a luta na morte de Alfredo Lima, este foi assassinado na praça de jornas.
O que era a praça de jornas?
Era um local onde os trabalhadores se juntavam para conseguir trabalho, normalmente no campo. Os capatazes mandados pelos patrões, contratavam-nos para os dias ou a semana de trabalho conforme o interesse do patrão.
Na praça de jornas os capatazes tentavam ao mando do patrão, contratar os trabalhadores com o salário mais baixo possível. Por vezes a luta era ralhada, quando os trabalhadores se juntavam a uma só voz, conseguia-se aumento de salário.
Era o que estavam a fazer quando mataram Alfredo Lima, como é sabido o regime fascista de Salazar estava sempre com o poder económico, com os patrões, e a GNR cumpria o papel do sistema, ao mando dos patrões na praça de jornas intimidavam os trabalhadores para não reivindicarem, por vezes existia conflito porque a necessidade era muita e existia consciência de classe, da exploração que estavam a ser sujeitos.
A GNR começou a disparar para intimidar os trabalhadores e mata Alfredo Lima.
Dias depois continua a intimidação e começam as prisões dos mais activos, tivessem presentes ou não.
Foi a primeira prisão do meu pai, andava a trabalhar fora da terra, nesse fim-de-semana não veio a casa, não esteve na praça de jorna, mas foi preso porque devia estar referenciado como desobediente ao regime.
Esta realidade foi-me contada, visto eu ainda não ter nascido o meu pai era solteiro.

2 - Prisão e morte
Na minha infância tive uma vida igual a muitos outros miúdos, mas com uma particularidade como poucos, de começar a compreender no concreto o porquê da luta de classes.
Aos cinco seis anos quando nós já memorizamos coisas de criança e que nunca mais esquecem, ficam para toda a vida.
Lembro de o meu pai contar, que quando foi preso pela morte de Alfredo Lima durante dois meses, sem culpa formada visto ele nem ter participado nessa praça de jornas. O conto destas situações trazia sempre alguma revolta visto a sua injustiça, mas amadureciam as pessoas, iam ganhando primeiro revolta, depois coragem e mais tarde consciência de classe e firmeza para enfrentar a dura luta contra as injustiças do capitalismo levado ao seu extremo a ditadura fascista.
O meu pai sentia-se revoltado em primeira situação pela morte do seu pai, meu avô que nunca chegou a conhecer visto ser deportado para Angola e lá ter falecido, quando foi deportado a minha avó ficou grávida do meu pai, nasceu e nunca conheceu o pai, mas teve sempre esperança que o um dia o encontrava. Foi uma grande mágoa que levou com ele nunca ter conhecido o pai, muita vez na vida me mostrou a sua indignação por tal situação, muita vez me transmitia a tristeza de não ter pai e nunca o ter conhecido, e nem fotografia existia.

(Continua)

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