sexta-feira, 6 de agosto de 2010

Histórias de vida (6)

(Por Américo Abalada) 

12 – Ainda a Segunda Prisão
Eu uma criança de seis anos de idade ficava muito revoltado por terem prendido o meu pai e não aceitava a situação nem compreendia, mas como criança ia vendo tudo e fixando tudo as maneiras as formas do processo de tudo, o comportamento dos guardas a organização etc. Dentro das salas existiam os guardas prisionais, na guarda da prisão existia a GNR. Em Caxias no reduto norte para entrar existia uma cancela que levantava para entrar e sair os carros deles, depois mais a frente havia um portão fechado com dois metros e tal de altura mais adiante voltávamos a esquerda havia outro portão que dava para um túnel com casas de um lado e de outro passando esse túnel ficávamos num pátio fechado existia uma porta a direita era a sala de visitas.
A partir daqui não conhecíamos mais, os presos chegam a visita não sei de onde. A sala tinha um banco corrido que dava para duas pessoas e um tipo de balcão ou mesa a nossa frente com uma parede de cada lado, o balcão tinha ai uns oitenta centímetros até a um vidro que dividia o preso das visitas, e do lado do preso era igual tinha também um balcão igual ao de cá, a distancia das visitas do preso era metro e meio metro e sessenta, separados ainda com o tal dito vidro.
A sala das visitas levava dez presos do lado de lá divididos entre eles com uma parede de cada lado, como era de cá, para não se verem e para nós também não vermos os outros presos, se as crianças se levantassem e saíssem do lugar viam o preso mas o guarda chamava a atenção a repreender as crianças e aos adultos não deixavam e existia sempre um PIDE para dois presos para ouvir o que se dizia e tomar conta de tudo. Dentro da sala dividida com o vidro era difícil a conversação ouvia-se mal e a sala intuía, dez presos com duas visitas cada um por média eram trinta pessoas a quererem ouvir-se e era muito difícil a conversação por vezes vínhamos da visita baralhados porque não tínhamos percebido metade da conversa.

13 – Em Liberdade
O meu pai saiu da prisão continuou a sua vida normal de trabalho, e as lutas continuaram de novo, porque a exploração era constante, a luta continuava com mais cuidados, porque era mais vigiado pelos bufos ao serviço do regime. A luta era mais organizada, esta agora era como militante do Partido Comunista Português, ao sair da prisão foi abordado para a necessidade de a luta ser mais organizada para o seu maior e melhor desenvolvimento em defesa do interesse dos trabalhadores, e só o partido com rigor e disciplina, conseguiam melhor ultrapassar e dar a volta a repressão do sistema, a luta clandestina tinha de ser rigorosa e precisa para não serem presos com tanta facilidade, e a nível ideológico o seguimento da luta, tinha objectivos concretos, e propostas concretas para acabar com a ditadura fascista, e criar um regime democrático de liberdade plena.
Estou a lembrar-me que existia documentos de lutas concretas como o Avante e o Militante órgãos centrais do PCP, esta luta era clandestina, os documentos tinham que estar bem guardados, escondidos por motivo de serem apanhados pelos bufos do regime ou a GNR a PIDE, por certo quem era identificado de os possuir apanhava muitos anos de prisão, ser membro do PCP ou apanhados com material do PCP, era grave.
O meu pai escondia a propaganda dentro dum barracão que tínhamos, debaixo da lenha enterrada dentro de uma quarta de barro, este e outros gestos eram realizados com a presença de toda a família a minha mãe e eu, o meu pai tinha por habito explicar os assuntos responsabilizava e explicava a razão do acontecimento das coisas as consequências, se outros soubessem a situação era grave pela nossa segurança, e eu compreendia muito bem, e que belo ensinamento de vida que o meu pai me deu o esclarecimento e a responsabilidade.

14 - Terceira prisão 06-04-1962 a 19-07-1962


O meu pai é preso de novo, as lutas desenvolvem-se, existe mais actividade, os bufos andam espreitando para ver quem mais se destaca, para poderem prender e atrasar o desenvolvimento da acção dos trabalhadores, para a exploração e o regime ir avançando.
Existe uma grande greve em Alpiarça, foram trabalhar três pessoas, podemos dizer que atingiu a totalidade da Vila. A luta estava a ter um grande êxito para os trabalhadores conseguirem os seus objectivos penso que era aumento do salário e outras regalias, os piquetes de greve fizeram um excelente trabalho conseguiram convencer os trabalhadores que só unidos conseguiam os seus objectivos.
Um dos três trabalhadores que foi trabalhar aparece a noite, na loja do Manuel e Júlio Calado, com farnel na bicicleta, o meu pai diz a um camarada para ir falar com ele e convence-lo para não ir trabalhar no dia seguinte e explicar o ponto da situação, o trabalhador em causa era o Rabeca, que de seguida foi carteiro muitos anos, morava no Vale do Rato, e depois no inicio do Vale do Rato ou melhor Rua Dr. José António Simões, na quina com a Rua do Bocage, a mulher ainda hoje lá mora a mãe do Aires.
O Rabeca não aceitou o contacto e formou-se ali uma grande discussão, que chegou a briga entre o meu pai e o Rabeca. O meu pai não queria ser ele a aborda-lo por motivos de segurança, porque existia sempre bufos misturados os que se sabia e outros que não conheciam se eram informadores da PIDE, tinha vindo da prisão não a muito tempo e tinha de ter cuidado, na prática não teve cuidado nenhum.
O Rabeca ficou um pouco dorido, abalou a gritar que ia a casa buscar a espingarda e que matava o meu pai. O Natalino morava no prédio em frente chama o meu pai para não avançar a confusão, dentro do prédio eles vêem o Rabeca chegar com espingarda a procura do Abalada como se fosse um coelho.
Os camaradas chamaram o Rabeca a razão e ele foi-se embora convencido que se tinha metido numa grande alhada, que o meu pai pelos acontecimentos ia preso de novo.
De seguida o meu pai vai para casa, passado pouco tempo bate o Rabeca ao portão para falar com o meu pai, o Rabeca pede desculpa do acontecido, e o meu pai diz agora vou preso de novo, estas lixado comigo, a conversa acaba.
Passado dias o meu pai vai preso por agitador e dirigente de greves, passa mais três meses e tal de prisão.
É posto em liberdade porque não conseguiram provar o que pretendiam, desta vez não o levaram a julgamento.   

(Continua)

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