sexta-feira, 6 de agosto de 2010

Histórias de vida (7)

(Por Américo Abalada)
15 – Uma visita ao Aljube

Um dia minha mãe ia visitar o meu pai estava na altura no Aljube, e eu era para ficar na escola para não ter muitas faltas. Ela ia sozinha e trouxe-me mais cedo para baixo e eu esperava um pouco que chegasse a hora da entrada da escola, mas que eu pensei que também devia ir ver o meu pai. A carreira na altura parava em frente a brasileira, a minha mãe estava a montar-se e eu subi para a carreira que também cria ir mas já chorava com alguma intensidade, birras de criança e estava predisposto a ir. A minha mãe ia-me convencendo a ficar com o coração já partido ao ver-me assim, mas a carreira não esperava por birras de criança. O sargento Pires, frequentava aquela zona e tentou puxar-me das escadas da carreira e dizia anda menino vai para a escola deixa a tua mãe partir, eu pontapeava o gajo, eu criança não podia nem ver aquela farda quando mais aquele malandro assassino, a minha mãe quando viu o sargento Pires a por a luva em cima do seu querido filho vem da carreira pelas escadas abaixo dá um empurrão ao sujeito, que se não fosse outros estarem por traz ele tinha ficado estendido no chão, e minha mãe disse com firmeza de uma mãe ferida, por as mãos em cima do meu filho seu malandro, basta em cima do pai quanto mais do filho.
A minha mãe pega em mim e na mala da escola, e lá vamos os dois ver o meu pai, quase todo o dia choramos foi um dia de martírio para nós, não choramos quando estávamos ao pé do meu pai na hora da visita, mas ele percebeu que estávamos tristes que ele perguntou, mas soube um dia mais tarde quando veio de novo para casa.
Quando estávamos nas visitas tanto os presos como as visitas, a postura era estar alegres com cara de esperança na perspectiva que a vitória era certa e que todos sabíamos o que andávamos ali a fazer, não se tinha matado nem roubado ninguém andava-se a realizar uma luta justa para o bem de todos dos mais necessitados e ainda hoje o objectivo é o mesmo.
 E como dizia Álvaro Cunhal, um dia quando o povo quiser, liberta-se-a da exploração que é alvo.

16 – Soltaram o Porco prenderam o dono
Certa noite o meu pai acorda com o barulho ao pé da porta do quintal de um porco que por norma estava no pocilgo, diz para minha mãe o porco parece que anda solto, e assim foi veio ver, e o porco andava solto, vai prender o porco e é surpreendido com a GNR a darem-lhe ordem de prisão visto ser de noite e arranjaram aquela forma de soltar o porco para o apanharem. O meu pai prendeu o porco, e responde a quatro GNR, que ia vestir-se e que já vinha ter com eles. Com toda esta situação eu acordo e assisto de novo a outro triste espectáculo de outra prisão. O meu pai entra para dentro de casa e diz ao cabo da guarda, agora eu só saiu aqui de casa quando nascer o sol, que é para as pessoas me verem ir preso, o cabo mostrou resistência e cria arroubar a porta. O meu pai desesperou e disso espere menta meu canalha se tocas na porta comete vivo.
O cabo ficou com outra praça ao pé da porta do quintal e mandou os outros dois para a porta principal, esperaram até nascer o sol, o meu pai lá foi preso no meio de quatro GNR, pela estrada abaixo até ao posto, e eu com minha mãe a traz, e o meu pai ia falando as pessoas dizendo vou preso outra vez não matei nem fiz mal a ninguém, ando a lutar pelos nossos interesses e esses malandros levam-me de novo preso, e assim foi a viagem  até ao posto e eu esta criança a assistir.
Íamos pela rua do casalinho abaixo em frente a loja da Maria Domingos, o meu pai pára e volta-se para o cabo da guarda e diz, o senhor não tem vergonha virem quatro homens armados de espingardas, prender um pessoa de paz indefesa e irem a fazer este triste espectáculo rua abaixo, o cabo mandou duas praças em paço de corrida e ficou ele com outro para caminharem com o meu pai.
Quando chegaram ao posto da GNR em Alpiarça, antes de chegar a PIDE, para o transportarem para Santarém e mais tarde para Lisboa, ainda fizeram o serviço deles, o cabo com o sargento Pires, danados e raivosos como cães, ainda lhe bateram e bem, para se pagarem das resistências do Abalada.   
 
17-Quarta prisão            
No dia 29 de Outubro de 1963, meu pai é preso pela quarta vez, esta prisão durou cinco anos quatro meses e sete dias. Saiu em 8 de Março de 1969.
Esta prisão dá-se por um acumular de lutas, a ultima foi a comemoração do dia 5 de Outubro, dia da implantação da Republica Portuguesa, a situação complicou-se no acto de rebentar o fogo, mandar foguetes em três sítios diferentes com pouco espaço de tempo, o que baralhou um bocado as coisas. A GNR e a PIDE, quase que apanharam os activistas que estavam a mandar os foguetes, começaram a tiro para o sítio onde estava a sair o fogo, e eles não se estavam a aperceber pensavam que o barulho era os outros camaradas que estavam em outro local dos foguetes, mas os tiros começaram a cair por perto e um levou um tiro de raspão num pé, foi um alerta para fugirem, deixaram o resto dos foguetes e um casaco pendurado numa oliveira.
O meu pai deixou um casaco muito conhecido com quadrados acastanhado, nos dois dias seguintes não apareceu em casa, com medo de ser preso, o casaco do meu pai foi oferecido pela GNR coordenado com a PIDE a um trabalhador da Câmara muito pobre que o trouxe sempre vestido nesse Outono e Inverno, mas passados esses dois dias o meu pai aparece com um casaco igual ao que a GNR apanhou, foi pedi-lo emprestado a um Alpiarcense que o tinha, era só os dois casacos iguais existentes na terra, mas o inevitável aconteceu.
O meu pai foi preso outra vez.  
Este afastamento forçado que eu tive do meu pai foi muito difícil para mim tinha dez anos, tinha passado pelas outras prisões e já tinha aprendido muita coisa, e já pensava e analisava melhor as situações, foi duro. Foi difícil para mim e para a minha mãe dos dez aos quinze anos de idade estar sem o meu pai.

(Continua)

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